Por Roberto Blatt


Esse texto é parte de uma dúvida: por que Community é tão engraçada? Não conseguirei responder essa pergunta, mas dado que acho a série altamente recomendável não vou me furtar a produzir dois ou três parágrafos que se seguem.

 

Community tem lá suas semelhanças com Friends: no fundo é um grupo de amigos e suas interações mais ou menos atrapalhadas numa universidade comunitária. O tom da série aproxima-se mais de Weeds porque eventualmente aborda temas urbanos e politicamente polêmicos: há sempre um “suspense cômico” acerca de assuntos como racismo, machismo, homofobia.


Até mesmo o tema da meritocracia, em menor escala, é abordado, como pano de fundo, já que a universidade comunitária tem um estigma pobre na cultura audiovisual norte-americana. Apesar de não fugir muito das fórmulas de humor convencionais, de consagradas sitcom, algumas das piadas tem perspectivas curiosas e risíveis justamente por conta desse cenário mais “decadente” digamos assim.

 

Outro aspecto curioso, embora não singular, é a variedade de tipos dos personagens: todos eles com características próprias, o que não impede de serem bastante comportados politicamente, quase num padrão subjacente de comportamento. Até mesmo o personagem de Chevy Chase, que seria um velho machista e racista, tem lá seus momentos edificantes. Talvez essa seja uma inovação ao zombar de uma figura nesses moldes: homem, branco e rico é o alívio cômico da série. Mas, calma lá, as mulheres também são “zuadas” e até mesmo, eventualmente, estereotipadas, entretanto isso eu deixo para vocês descobrirem assistindo.  

 

Chama a atenção a capacidade de referir-se à cultura pop, notadamente através dos personagens Abed e Troy (magnificamente interpretados por Danny Pudi e Donald Glover) que em alguns casos conseguem ser mais cômicos nas intervenções de final de episódios, pós-créditos, do que no próprio enredo encenado. Um dos episódios que mais gosto da primeira temporada, cujo título pode ser traduzido “Cerâmica Iniciante” (1×19) é particularmente explícito nas referências à indústria audiovisual: nele aprendemos um pouquinho sobre a teatralidade no cinema (cenas do “navio”) e mesmo sobre narração, quando Abed inicia uma fala acerca do estado subjetivo de Jeff e sua inveja por um personagem mais habilidoso que ele. Isso sem falar das menções aos filmes Ghost e Titanic, que são realmente hilárias.

 

O americano Jason Mittel escreveu sobre a importância dos episódios pilotos em séries de TV num artigo que tem publicação brasileira como “Complexidade narrativa na televisão
americana contemporânea”, encontrável nos repositórios da USP. Nessa obra aprendemos que um episódio piloto funciona numa analogia com um tutorial de videogame: aprendemos as regras daquele universo, os obstáculos a serem superados e as metas a serem atingidas. Isso tudo visando cativar o público para seguir acompanhando a obra.

  

 

No caso de Community esse paradigma é alcançado de forma muito charmosa na referência ao clássico filme de John Hughes “Clube dos Cinco” que é teatralizado por Abed logo no primeiro encontro da Comunidade. E também nesse momento se estabelece a própria regra geral, os obstáculos e as metas (paradigma de Mittel): o grupo é uma comunidade e sairá dali mais unido na sua diversidade, do mesmo modo que acontece no filme Hughes. Community nos pega no emocional consagrado.

 

A deferência fica explícita na homenagem ao final do primeiro episódio:

 

 

O teórico francês François Jost escreveu um livro cujo título é “Do que as séries americanas são sintoma” onde a tese principal associa os seriados à um história de ninar que a criança pede para a mãe repetir todas as noites. Tenho para mim que essa tese possui certo grau de verdade, e pode inclusive ser aplicada à Community, como de resto à várias séries que mantém personagens estereotipados, porém seguros, constantes. Dito tudo isso posso afirmar que a Community é das mais engraçadas que já vi e, no momento, minha “historinha pra dormir” preferida. No fundo esse post quer apenas isso: recomendar que você vá lá e dê umas risadas desse pessoal.

 

 

Nota: 8,5/10

 

 

 

Fonte da imagem : http://www.fansshare.com/gallery/photos/11640696/community-wallpaper-show/?displaying

 

 

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Sobre o Autor

Não sou cineasta, mas gosto de criticar o trabalho dos outros rsrsrs

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